Pensando no mundo do ciclismo, falarei sobre um assunto muito importante: saúde mental no mundo da alta performance.
Existem muitos estudos publicados que comprovam o impacto positivo que a prática de esportes traz para a saúde. Afinal, estar ativo aumenta a expectativa de vida, nos deixa mais felizes e com motivação. Além disso, ajuda a economizar um bom dinheiro em remédios e hospitais.
Mas, todo remédio em excesso pode se tornar um veneno. A prova disso é o aumento da incidência de casos de ciclistas profissionais que relatam problemas com depressão.
Pressão sobre os atletas
O ciclismo ganhou muita atenção nos últimos anos. Com ele, veio também o aumento da audiência, a profissionalização das equipes e um fluxo de dinheiro maior. Por outro lado, há uma enorme pressão sobre os atletas, para que estejam sempre nos holofotes como protagonistas do show.
É muito bacana ver o espaço que nosso esporte conquistou, mas, definitivamente esse crescimento não veio sem preço. A busca pela perfeição está cada vez mais os limites da mente e do corpo.
Cada atleta passa uma carreira inteira se dedicando a esses ajustes. Portanto, como é de se esperar, encontra seus limites com grande frequência. Além disso, precisa dispor de muitos recursos internos e externos para lidar e superar esses testes.
O assunto não é novo
A história do ciclismo sempre foi essa. A busca pela superação física não é uma tendência recente e acredito que não é essa a justificativa para os tantos casos de atletas profissionais vindo a público nas mídias sociais para falar sobre saúde mental.
No intervalo de pouco mais de um ano, vimos exemplos de histórias que com certeza farão parte de uma nova era:
Jenny Rissveds
Na sequência de duas etapas que abriram a temporada de 2019 do World Cup de Mountain Bike, presenciamos o retorno de Jenny Rissveds. A atleta foi campeã olímpica no Rio de Janeiro, em 2016.
Jenny fez uma pausa temporária em sua carreira para tratar uma depressão. Porém, felizmente está de volta e anunciou a criação de uma equipe que terá um cunho social, trabalhando em prol de direitos infantis. Para quem quiser acompanhar sua história de perto, acesse seu instagram e site.
Marcel Kittel
Em maio de 2019, o sprintista do time Katusha-Alpecin comunicou a todos que rescindiu seu contrato por não estar se sentindo mais feliz e motivado em sua profissão. Confira o texto completo aqui.
Kelly Catlin
Antes disso, em março de 2019, o mundo se chocou com a morte da atleta americana de apenas 23 anos, tricampeã mundial e medalhista olímpica, Kelly Catlin. Ela foi encontrada já sem vida em seu quarto, dentro da universidade de Stanford. Posteriormente, foi confirmado se tratar de um caso de suicídio.
Peter Kennaugh
Outro atleta que falou abertamente sobre sua depressão e seu afastamento do ciclismo profissional foi Peter Kennaugh, medalhista de ouro nas olimpíadas de Londres. Peter fazia parte da equipe de Peter Sagan, Bora-Hansgrohe. Leia seu relato no Instagram.
Victoria Pendleton
Ainda este ano, em Janeiro o jornal britânico The Daily Telegraph publicou uma entrevista com outra multicampeã, a ciclista Victoria Pendleton, onde ela confessa conviver há anos com depressão. Inclusive, pensou muitas vezes em tirar a própria vida por não encontrar sentido mais em viver.
São muitos os casos! Contudo, o fato de começarmos a falar sobre o assunto já é um passo positivo na superação do problema.
Minhas experiências
Percebi que a forma como uso as redes sociais pode me afetar emocionalmente. Além disso, influencia minhas expectativas e metas que estabeleço.
Como atleta profissional, uma das formas de gerar valor para os patrocinadores é através de minha imagem. A partir do momento que assumo um perfil público, estou aberta a todo o tipo de interação. Dessa forma, acabo criando expectativas nas pessoas que me acompanham.
Nos acostumamos a só dar valor para coisas belas e teoricamente perfeitas. A pressão para entregar esse tipo de conteúdo se torna maior e o que não gera muitos “likes” é reprimido.
A forma que eu encontrei de dar “vazão” a esse conteúdo que tem pouco valor nas redes sociais foi dar um passo para trás da vitrine. Ou seja, buscar conexões de carne e osso, usar minha rede de apoio e minha comunidade para me dar mais propósito. Tudo isso a fim de aumentar a cultura do amor incondicional.
Por fim, talvez seja uma saída viável para outros atletas com alto padrão de exigência pessoal e baixa tolerância para o fracasso. Estamos todos conectados e, quanto mais nos conscientizarmos disso, maior a chance de evitar que casos como os citados acima continuem a acontecer.